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TURNAROUND E RECUPERAÇÃO DE EMPRESAS

O mercado de Consultorias para recuperação ou turnaround de empresas está interferido por oportunistas que, sem amor ou respeito ao empreeendedor, vêem na situação a chance de obter ganhos expressivos, ou mesmo caminhar para a participação nas cotas do negócio. Mas, felizmente, existem aqueles que se dedicam realmente a restaurar as condições originais do negócio, e dar-lhe forças e músculos para se reerguer, e seguir em frente. De modo geral, o que encontramos nas empresas que precisam de recuperação, são transações extra-gestão das operações, que produzem impacto na equação econômica, mesmo que esta seja estruturalmente capaz de levar ao objetivo. Para isso, é necessária a competência de gerir o negócio, em todos os sentidos, e de identificar as anomalias e equacioná-las para reduzir ou eliminar o impacto. Mais, no artigo abaixo.

 

A Recuperação de empresas pode ter diferentes abordagens. Elas são dependentes do histórico que levou a empresa a essa situação de insolvência e/ou inoperância.

 

Em alguns casos, a empresa é viável economicamente, mas fez e faz má gestão de preços e custos, tornando-se inviável. Em outros casos a gestão é saudável, mas as empresa fez e/ou faz operações financeiras que criam dívidas que contaminam as contas operacionais. E, finalmente, como adição ou única razão, a empresa sofreu roubos e desvios que deformaram sua estrutura financeira e seus efeitos corroem sua operação atual.

 

Algumas empresas sobrevivem a essas situações porque seus provedores não param de colocar recursos para a manutenção da empresa, sob a expectativa de que ela volte à rentabilidade projetada. Isso retarda o reconhecimento da necessidade de recuperação. Quanto mais tarde, pior fica. Mas, se ela for basicamente viável no sentido econômico, sempre é tempo de enfrentar o problema.

 

Constrange essa decisão a existência intensa de abutres no mercado, que agem sob a forma de factoring ou sob a forma de administradores, mas com o intuito de obter a empresa ou a maior parte dela para si. O empresário tem dificuldades em saber quem é quem, e adia a decisão. Desejo falar aqui apenas da recuperação legítima, em favor dos donos originais. E me restringir à recuperação executiva, não judicial. Tratarei da recuperação judicial, uma forma válida em função das circunstâncias, no final deste artigo.

 

Há também que se diferenciar recuperação de turnaround. O turnaround geralmente conta com Capital de Giro, ou uma situação de crédito remanescente, por instituições financeiras ou fundos de investimento, dispostos a apostar na Gestão. Mas precisa ser uma nova gestão, com novas propostas.

 

Ensaiamos aqui alguns dos passos principais para que se busque a recuperação da empresa.

1. Disposição dos cotistas ou acionistas em aceitar o status da empresa e focar na recuperação. Parece óbvio, mas é uma decisão difícil, porque significa reconhecer que algo falhou, e que a gestão não vai bem. E essa decisão, uma vez tomada, costuma regurgitar ao longo do esforço de recuperação. A cada dificuldade ou concessão, ela volta à cena.

 

2. Identificação acurada e completa dos passivos e ativos da empresa, e sua posição jurídica e financeira. Esta parte também não é fácil, porque a documentação é dispersa e um tanto secreta, ocultada pelos protagonistas das operações em função do seu significado potencial para o status negativo da empresa. Não desejam explorar as decisões negativas tomadas no passado. É preciso ter muita habilidade nesta etapa, para realmente equacionar o quadro completo. Os passivos se dividem em diversos tipos: tributário - municipal, estadual e federal, bancos e instituições financeiras, fundos de investimento, empréstimos pessoais, operações de leasing com fornecedores, dívidas com fornecedores, e outros. Para cada um desses grupos há um tratamento diferente, levando em conta sua capacidade de negociação e a capacidade de pagamento da empresa.

 

3. Identificação sensível das pessoas que compõem a empresa, com avaliação de sua competência efetiva e lealdade potencial ao novo esforço de recuperação. Nesse momento, é preciso olhar o todo, e proteger os empregos tanto quanto possível, mas focando naqueles capazes de agregar valor efetivo ao negócio. Geralmente existem más formações de quadros de pessoal, que precisam ser corrigidas com reduções e realocações, o que costuma provocar a queda da moral. Isso é extremamente negativo para a recuperação, que precisa exatamente do oposto. Ao Gestor da recuperação caberá realizar rapidamente essa cirurgia, e então inspirar motivação total na nova estrutura. O mote dessa motivação é a defesa contra os agentes econômicos que ameaçam a saúde da empresa. Isso facilita a missão.

 

4. Imediata implantação da Gestão por Fluxo de Caixa. A disposição diária do dinheiro disponível deve ser muito discricionária, e dirigida à atividades capitais do negócio. O fato de que as decisões se tornam diárias não dispensa o planejamento do Fluxo de Caixa, que não só dá o horizonte possível, como permite que se assumam compromissos com os credores.

 

5. Identificação e avaliação das fontes de crédito atuais, e eventual substituição por fontes menos predadoras. É comum encontrar empresas em dificuldades patrocinadas por créditos predatórios, que só interessam ao credor, e contribuem para afundar cada vez mais a empresa. Nestas circunstâncias, não há a expectativa de encontrar crédito de incentivo, mas ainda é possível. Mesmo que não se encontre este tipo, haverão com certeza fontes menos predatórias, incluindo aquelas conseguidas junto aos Clientes, através de adiantamentos escalonados. 

 

6. Identificação do passivo jurídico cível e trabalhista da empresa, e identificação de com quais advogados e como os processos estão sendo tratados. Esta parte é geralmente muito sensível, e passível de dramáticas mudanças, que irão criar fortes resistência à Gestão. Muitas vezes, existe aqui uma relação antiga de confiança com os donos da empresa, e essa relação também poderá ser desafiada. Pode haver a necessidade de troca de advogados e estratégia jurídica.

 

7. Identificação e avaliação das condições operacionais e do valor efetivamente agregado aos Clientes. Investigação direta da satisfação dos Clientes, e sua disposição em continuar com a empresa. Início de diálogo claro e direto sobre a gestão futura e a posição relativa de cada Cliente em relação a ela. Correções imediatas das insuficiências operacionais eventualmente identificadas ( geralmente existem ).

 

8. Revisão das condições econômicas dos contratos comerciais com os Clientes, com foco em sua saúde econômica. Em função da revisão, estudo de proposições para recuperação da saúde dos contratos não saudáveis. Esta atividade é simultânea e concordante com a atividade anterior (7), por ser um diálogo com as mesmas pessoas. Usualmente as negociações são feitas com planilha aberta, com o objetivo explícito de garantir saúde econômica ao contrato ( vendas ou serviços ). Nesta etapa é provável romper com alguns Clientes, que não disponibilizam condições para essa recuperação.

 

9. Busca estratégica por Novos Negócios. Em geral a empresa é encontrada em depressão moral neste sentido. Ela se encolhe devido às suas dificuldades, e se concentra em entregar os negócios existentes. Mas existem muitos potenciais Clientes que superam o preconceito sobre o status da empresa e se dispõem a construir parcerias que beneficiam a ambos. Cabe ao Gestor elencá-los, encontrá-los e motivá-los. Estes novos negócios poderão substituir negócios anteriores impossíveis de corrigir.

 

10. Iniciativas de Inovação no segmento. Inovação não é necessariamente custo, e passa ao mercado uma imagem saudável e forte. É o uso da inteligência em sua mais simples expressão.

 

11. Negociação com Fornecedores. Esta é uma parte fundamental sobre a sobrevivência da empresa. Os Fornecedores exercem um papel fundamental na viabilização da empresa. Muitos acompanharam a empresa em seus tempos saudáveis e a perceberam entrando em dificuldades. Estes geralmente estão dispostos a vê-la saudável novamente, e ajudam como podem. Outros nem tanto, mas sempre estão dispostos a negociações, porque a alternativa é perder o Cliente de modo definitivo. Quando se juntam as capacidades econômicas da empresa e seu fornecedor, aparecem novas oportunidades boas para ambos.

 

12. Corrigir e atualizar a Contabilidade. Geralmente os desvios de procedimento de gestão são acompanhados de desvios de registros contábeis, ou ainda grandes atrasos na apuração fiscal. Estar em dia é vital para a medição efetiva do negócio, para recuperar governança, e para dar sustentação às negociações com os credores de maior formalidade.

 

13. Sistema Integrado de Gestão. Esta é a ferramenta cuja consistência exige gestão operacional, financeira, contábil e fiscal acurada. Já dá pra imaginar como ela é subvertida em empresas em que a gestão deformou a empresa. Sem dúvida, necessariamente deformou o sistema, sempre em suas informações, mas muitas vezes em sua própria estrutura lógica, com intervenções desastradas em seu banco de dados. Este ponto é fortemente relacionado ao anterior ( 12 ). A sua reconstrução costuma exigir uma verdadeira reimplantação.

 

O Gestor da Recuperação

No mercado há um mito que atribui ao Gestor a prerrogativa de se beneficiar financeiramente de sua ação, cobrando salários robustos e participações nas renegociações. De fato muitos são assim, mas nem todos. Alguns respeitam o empreendimento e os empreendedores, e os empregos gerados. Buscam receber o justo prêmio por sua atuação, mas sem qualquer resquício predatório.

 

A Recuperação Judicial

Este recurso é legal e válido em diversos casos, mas implica na efetiva capacidade de, isolando o passado, passar a cumprir à risca os compromissos presentes e futuros. E implica em interpor um administrador entre a empresa e seus parceiros externos, Fornecedores e Clientes. Nesse ato se perde a cumplicidade, as componentes de confiança e amizade, a disposição de crédito, e tudo passa a ter conotação jurídica, com as atuações de advogados e de um juiz, além do interventor. Entrar com este pedido na Justiça só faz sentido se todas as possibilidades acima já foram perdidas, ou ficaram enfraquecidas.

 

Mesmo assim, para os observadores externos, as particularidades da RJ podem ser brandas ou graves. As brandas são aquelas em que as negociações são concentradas em Bancos, porque existem muitas formas de reduzir o cálculo da dívida e equacioná-la ao longo de um prazo viável. No outro extremo estão aquelas em que as grandes dívidas são com os Fornecedores, que podem não ter a capacidade se suportar os efeitos da RJ e mesmo assim ajudar a empresa. No meio disso ficam os investidores e fundos de investimento, que não têm interesse em inviabilizar a RJ.

 

Moral da História: recuperar uma empresa, um inestimável bem social, é sempre possível. O que muda é a dose do remédio.